quarta-feira, 5 de março de 2008

Parece que Joan Miró gostava de tortilhas com'ó caralho...!


Adoro os novos eufemismos (para os menos astutos, estou a lançar mão da figura de estilo conhecida por ironia – e sem evasivas). Andam na boca de toda a gente. Modas, diz o frívolo leitor todo empertigado. Areia para os olhos, elucido eu no alto da minha omnisciente sapiência. No fundo, e excogitando um pouco a questão, a praga dos novos eufemismos deixa antever o romper duma anunciada nova era, um período marcado pelo cunho das liberdades encapuzadas, reféns das sensibilidades mais ecuménicas e das mais grosseiramente impostas (e impostoras) compaixões. E isto está por todo o lado! Já não se encerram fábricas. Já não se interrompem projectos. Já não se suspendem estudos. Hoje tudo é descontinuado em função de alterações supervenientes na definição de conjunturas do tecido económico-empresarial-no-cu-social. Já ninguém sequer arranca dentes. Hoje fazemos extracções dentárias. Mas qu’ésta merda?! E já agora, será que nas relações, qualquer que seja a sua forma e nomenclatura, também lançamos mão desta epidemia de paninhos quentes e falsos sentimentos nobres?! Ora, claro que sim! E neste jogo de falsos interesses quem se lixa é o incauto honesto, o poeta das inevitabilidades, o anjo da toleima, enfim, o vulgar desbocado – uma espécie em vias de extinção, garanto eu. Hodiernamente, já ninguém ganha, simplesmente, coragem e atira o que lhe vai na real gana. Bem... há excepções. Mas a maioria – e é dela que aqui falo e desconsidero, duma forma mais ou menos perceptível – refugia-se nesta enrabichada forma de lide (o que eu gosto de inserir palavras, usualmente empregues noutros contextos, em frases e assim, como neste caso em que pincelo – e outra vez! – a imagem do aficionado da tauromaquia) dos problemas. Minha grei, neste particular, e quando lidarem com relações, não tenham medo, nem complacências e magoem com a verdade... ou com a mentira, não interessa. Há que magoar. Há que aleijar. Há que, pelo menos, espicaçar (quanto mais não seja para auto-recriação). E nas relações amorosas?, pergunta em surdina o boçal leitor sedento de vontade de se refrescar nesta enciclopédica fonte. Foda-se, claro! E não me venham com ladainhas de maturidades arrancadas a ferro e num suposto e insurrecto apelo interior pelo Bem. Muito menos me venham com historietas felizes, contadas na 36ª pessoa, duma prima duma ex-namorada vossa do liceu que terminou com o palerma, com quem habitualmente partilhava o leito, duma forma civilizada e que ficaram logo muito amigos e eles são um modelo para todos e mai não sei quê. Nada, mas nada mesmo, na sua forma final, é bonito. Nada! O fim da cópula (não!, depois disso) não o é. A imagem da aguarela que se alcança na loiça da sanita em dias de agudizada cocózada, não o é certamente. E não o é, também, e enquanto exemplo mais paradigmático, o fedor putrefacto dum corpo em decomposição, há dois dias na mala dum carro, com 3 chumbos dum revolver de calibre 6,35 embutidos, testa e peito, na sequência dum assalto a uma ourivesaria que escondia uma surpresa na forma de gente dentro do cofre, quando a verdade é que o seguro cobre tudo e aquele acto heróico era escusado e nem íamos levar muita coisa, só ouro, que eu vejo televisão e o preço da onça de ouro continua a bater recordes nos principais mercados internacionais e... Hummrrr! Bom, nos dias de hoje o português aparenta ser mais culto, mais instruído, mais sabedor. Aparenta um domínio da linguagem mais cuidada, muitas vezes mesmo, mais erudita. O português está a ganhar classe vernacular à boleia das eufemísticas imposições noticiosas e da gritante falta de coragem comportamental que é já ínclita além fronteiras. E não hesita em usá-la em tudo e com todos. E eu, caralhos me fodam, cada vez percebo menos o que se passa e se diz à minha volta e à volta dos outros, assim em geral.

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