sexta-feira, 8 de abril de 2011

Import/Export # 64: Portugal, esse país de PIGS e de lixo



«Primeiro, Portugal era um dos PIGS. Agora, estamos a um passo de ser lixo. Quando um país se move na alta finança é logo tratado com outra educação. As "agências de notação financeira" e os "mercados" dizem que o porco está a caminho do lixo. O porco somos nós. E o lixo também, o que é curioso - mas fisicamente improvável, uma vez que não é fácil alguém estar a caminho de si próprio.
Não deixa de ser interessante que estas opiniões dos mercados não sejam propriamente secretas. São publicadas nas primeiras páginas dos jornais. Há manchetes sobre o porco e reportagens acerca da distância a que ele está do lixo. Os mercados podem ter muitos defeitos, mas ao menos são sinceros. Se acham que um país é porco e caminha para o lixo, dizem-lho na cara.
Infelizmente, este tipo de linguagem só se tolera a quem usa gravata. A hipótese de Portugal ripostar parece estar posta de lado. Seria justo que, ao lado de uma notícia que diz "Mercados consideram que o país está a um patamar do lixo", houvesse outra cuja manchete fosse: "Portugal tenta renegociar a dívida junto dos chulos". O problema é que os mercados, além de deterem o capital financeiro, detêm ainda o capital semântico. Tudo o que seja capital, eles açambarcam. Um insulto na boca dos credores é realismo económico, na boca dos devedores é primarismo ideológico.
Esta evolução do jargão económico tem, como é evidente, pontos positivos. A substituição de palavras como subprime e rating por terminologia financeira como "porcos" e "lixo" é um contributo muito saudável para aproximar os cidadãos da vida económica. (...)»

by Ricardo Araújo Pereira in "A Boca do Inferno", revista Visão (08.Abril.2011)

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