António Botto, outro escritor que produziu pensamento (e não só: também produziu acção, e muita) sobre o cu, escreveu um poema célebre que começa com o verso "Nunca te foram ao cu". Porém, o que em Botto é lamento nostálgico, em Viegas é esperança e projecto de futuro. Ambos os poetas idealizam um cu, mas Botto lastima que o proprietário do cu que contempla nunca nele tenha tomado, ao passo que Viegas oferece ao titular do cu que imagina um incentivo a que lá tome.
É curioso constatar que há mais poesia no cu de Viegas do que no cu de Botto. O cu em que Viegas manda tomar é um cu simbólico. Trata-se de um cu que é metonímia de outro cu. Viegas não ignora que, acima do cu do fiscal das facturas há outros cus, bastante mais poderosos - e, acima desses, outros cus ainda. Essa hierarquia de cus culmina num cu-mor, responsável último pela ideia da fiscalização de facturas. É esse o cu a que Viegas deseja aplicar a receita que prescreveu. O antigo secretário de Estado está, portanto, a mandar tomar no cu por interposto cu. É um cu labiríntico, aquele que nos é apresentado neste jogo de espelhos de cus.»
by Ricardo Araújo Pereira in revista Visão (21.fev.2013)
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