«No sábado à noite, Pedro Passos Coelho escreveu, como “cidadão e como pai”, um texto com meia dúzia de parágrafos na sua página do Facebook. Nessa breve nota, quase “intimista”, assinada por Pedro, pretendeu dizer o quão “ingrato” foi, para ele, o discurso em que teve de anunciar as medidas no dia anterior e, ao mesmo tempo, avisar “que os sacrifícios ainda não terminaram”, não fosse alguém esquecer-se que ainda tem muitas “culpas” para expiar antes do “juízo final”. O conteúdo das breves linhas, aparentemente dirigidas pelo primeiro-ministro aos seus “amigos” daquela “rede social”, é uma desastrada tentativa de “humanizar” o primeiro responsável pela sórdida política – a mais sórdida executada em Portugal desde 1976 –, que consiste, em nome dos “falcões” do dinheiro e da especulação financeira, rapinar até ao último cêntimo os magros salários da maioria dos portugueses, sujeitando-os a um indigno calvário de pobreza e humilhações. Como não podia deixar de ser, o tiro saiu-lhe pela culatra: a maioria dos comentários que horas depois já tinham sido feitos, mais de dezoito mil, são críticas de quem não acredita que estas medidas resolvam os nossos problemas, feitas com violência verbal, com achincalhamento político e pessoal do visado, com um requintado exercício de escárnio e maldizer, em muitos casos roçando o impropério e a ofensa que, caso representassem a indignação e a revolta de um país, o colocaria à beira de uma implosão social sem precedentes na sua história. Nem em Dezembro de 1640, nem em Outubro de 1910, nem em Abril de 1975.
[Muitos] milhões de portugueses acreditaram que Passos Coelho falava verdade durante a campanha eleitoral, quando lhes disse que não aumentava impostos ou que não lhes roubava salários inteiros de uma assentada; uma grande parte destes milhões de portugueses acreditou que Passos Coelho lhes falava verdade quando disse que as “gorduras” do Estado davam e sobravam para pagar a factura de todos os desmandos dos governos anteriores, desde Cavaco Silva; uma grande parte destes milhões de portugueses acreditou que Passos Coelho falava verdade quando lhe disse que os sacrifícios eram a dividir por todos os portugueses, incluindo os que possuem riquezas imensas e os que lucram e ganham fortunas; uma grande parte destes milhões de portugueses acreditou que não era possível que alguém eleito o espoliasse desta maneira, como acreditou no equilíbrio dos poderes constituídos pelo regime democrático: que o Tribunal Constitucional servia para alguma coisa, tal como a eleição de um presidente da República.
Agora que a trapaça está exposta na montra, sem embalagem, nem fitinhas a adorná-la; agora que sabemos que o único objectivo deste governo é a redução dos salários e o empobrecimento dos portugueses, aguardamos o desfecho final. Ou tudo isto é só fumaça? Ou apenas “somos, socialmente, uma sociedade pacífica de revoltados”, como disse Miguel Torga?»
by Tomás Vasques in Diário Económico (10.set.2012)
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