«"Se algum dia tiver de perder umas eleições em Portugal para salvar o País, que se lixem as eleições, o que interessa é Portugal.", disse esta semana Pedro Passos Coelho. É uma declaração que rejeita o eleitoralismo ao mesmo tempo que é profundamente eleitoralista, e por isso só está ao alcance de um político muito hábil. Sou um grande admirador de declarações que contradizem aquilo que afirmam. "Eu não gosto de falar de mim", diz alguém. E eu rejubilo, porque essa pessoa acaba de me fornecer uma informação sobre si mesma - logo ela que não aprecia fazê-lo. Com Passos Coelho sucede o mesmo: é eleitoralista quando repudia o eleitoralismo. (...)
[Surge assim o passoscoelhismo, uma religião que, ao contrário das demais, não se limita a oferecer a salvação apenas aos crentes que nela acreditam]. Passos Coelho é o nosso redentor quer nós queiramos quer não. Ele vai salvar-nos e é à bruta. (...)
Outra distinção importante reside no facto de Cristo se ter sacrificado por nós. Passos Coelho optou por infligir os sacrifícios àqueles que pretende salvar. Uma coisa é ser Messias, outra é ser parvo. Cristo percorreu a Via Dolorosa; Passos Coelho põe o povo a percorrê-la. E antes fez com que a via deixasse o regime SCUT, para a cruz ficar mais pesada. (...)»
by Ricardo Araújo Pereira,
in "Boca do Inferno", revista Visão (26.jul.2012)